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quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Minhas impressões sobre o comércio da saúde americana

Olá pessoal! 
Bom, eu havia prometido que ia voltar a postar assim que voltasse da viagem, no dia 28. Mas minha vida anda corrida, estou fazendo muita coisa... No fim das férias ajudei com a ilustração de um vídeo do Teoria da Medicina, se vocês quiserem ver cliquem aqui e aqui! E, logo depois, voltaram as aulas, voltaram as matérias... E a cereja no topo do bolo é: a liga da qual sou secretária (Liga Acadêmica de Farmacologia Aplicada - LAFA) e a Liga Acadêmica de Fisiologia Luiz Carlos Bertges (LAFLCB) estão organizando o I Congresso de Fisiologia de Juiz de Fora (fica a dica aí de evento científico pra quem é de Juiz de Fora e região!)... então vocês podem imaginar né! Muito, muito trabalho...
Pretendo postar mais no fim de semana ou no início da semana que vem, mas como já expliquei que o trem tá feio pro meu lado, as postagens serão menos frequentes por agora. Mas não se preocupem, muitos posts legais já estão sendo preparados!
Calorão em Miami (eu e meus bros peixe-boi)...
Faz pouco mais de duas semanas que cheguei de uma temporada de 14 dias nos Estados Unidos. Fui pra Miami e depois pra Nova York, sendo que fiquei a maior parte do tempo nesta última cidade. Minha mala estava extremamente engraçada: tinha shorts, camisetas e um monte de casacos pesados e blusas térmicas - contradição total. Miami, como sempre, estava bem quente, mesmo sendo inverno - acho que chegamos a pegar uns 30 graus lá. Já Nova York começou mais ou menos em 0 graus, depois deu uma esquentadinha (esquentadinha = 9 graus, no máximo) e voltou a congelar - teve um dia que fez -12 graus, obviamente eu chorei e parte do meu cérebro congelou. 
Não gosto muito de frio. Se eu fosse um pokemon, ataques de gelo seriam super effective contra mim. E o pior mesmo não era nem as baixas temperaturas, era o vento bizarro. Lá venta MUITO - o que é de se esperar pra um conjunto de ilhas. Mas mesmo no meio da cidade, com todos aqueles prédios enormes, às vezes vem aquela corrente de vento que chega até a te empurrar de tão forte. E o pior: é uma corrente de vento gelada. Pense em alguma vez que você foi à praia e bateu aquele ventão refrescante enquanto você olhava pro mar. Agora mude o cenário: não tem praia, está -5 graus e o vento chega a dar queimaduras de frio (sério).
...frio infernal em Nova York (pra mim, se existe inferno, ele é frio). 
Brincadeiras a parte, Nova York é uma cidade belíssima. Miami também, mas não chega a tanto. NY empata com minha cidade preferida no mundo todo, Londres.
Eu poderia falar muito mais coisas sobre ambas as cidades, mas queria focar no que vi em relação à saúde nos Estados Unidos. Se rolar um feedback positivo com relação a falar mais sobre a viagem, as cidades e o país em si, faço um post sobre isso futuramente.
Se você é novo por aqui, provavelmente não leu ainda minha postagem sobre o filme Sicko, do diretor Michael Moore. Lá, faço comentários sobre o sistema de saúde dos EUA. Agora, queria abranger o lado das pessoas, aquilo que percebi em relação à população e ao que é passado pra ela.
Times Square
Os EUA são um país onde o dinheiro corre solto. Os salários são bons e tudo é barato. A única coisa que percebi ser muito cara é o aluguel de moradias e o preço de compra das mesmas. Não sei informar em relação aos impostos. Mas de resto, é tudo barato. Comida, roupa, brinquedos, jogos, eletrônicos, produtos de utilidade médica. Cheguei a comprar uma blusa bem bonitinha por 3 dólares (algo que, numa loja de departamento brasileira, não sairia por menos de 30 reais). Existem coisas caras também - as roupas da Lacoste, por exemplo: mesmo lá se paga um absurdo por uma camisa lisa com um jacarezinho. Porém, tudo que custar mais lá, no Brasil custa o dobro.
Por causa dessa facilidade de compra, os bens parecem ter menos valor emocional. Se seu computador deu defeito, é simples: compre outro. Ninguém parece se apegar a nada que lhe pertence, pois é fácil substituir.
Devo ressaltar também como a propaganda lá é forte. Nessa foto aí em Times Square - o "coração do mundo" - todas essas coisas brilhantes grudadas nos prédios são publicidade. Se anuncia de tudo - desde séries de TV (tava lotado de coisa de Smash, por exemplo) até seguro de vida. É o lugar mais caro pra se fazer um anúncio no mundo.
Feita esta pequena introdução, posso prosseguir. Queria que você, que está lendo o texto, imaginasse uma propaganda de remédio brasileira. Provavelmente, vem na sua cabeça aquelas publicidades de remédio pra dor de cabeça ou dor no geral, com o final clássico Este medicamento é contra-indicado em caso de suspeita de dengue. É basicamente o que se tem por aqui, né?
Nos EUA isso é totalmente diferente. Primeiro que lá não se faz propaganda apenas de antiinflamatório: tem de tudo. Anti-hipertensivo, antibiótico, benzodiazepínico e até remédio pra cobreiro (vou  voltar nessa bizarrice depois, continue lendo). É sério! Segundo que os anúncios lá seguem um formato padrão, mas bem diferente do que temos aqui em Terra brasilis: começa com uma pessoa (geralmente uma mulher) dizendo como ela era infeliz quando tinha a doença X e como a vida dela ficou linda depois que passou a tomar Y. É tipo uma entrevista, com cenas da vida cotidiana dela (mostrando, por exemplo, como ela não conseguia fazer mais nada por causa da doença e como, depois do remédio, tudo ficou cor-de-rosa). Até aí tá de boa né? Bom, é depois que a pessoa usada como modelo fala que começa a estranheza toda. Uma voz, falando extremamente rápido, vem dizendo dados sobre o remédio - tipo aquelas coisas que a gente lê na bula - enquanto passam mais cenas da pessoa felizona após tomar Y. É tipo uma Este medicamento é contra-indicado em caso de suspeita de dengue extended Director's cut, com cenas da vida da modelo usada ao fundo - e não uma tela azul.
Geralmente, escolhem coisas bem bregas pra passar - estilo comercial de absorvente, em que, aparentemente, supõe-se que toda mulher menstruada sai de branco pra dar piruetas: a pessoa previamente doente andando na praia com seu cônjuge, jogando o ossinho pro cachorro buscar, dando risada com os filhos (se for alguém idoso, netos). Comemorando o famoso American Way of Life. Enquanto isso, vem a tal voz disparada falando coisas como Se você tiver 60 anos  ou mais, consulte seu médico antes de administrar Y. Se você sentir tonturas, suspenda o uso e procure seu médico. Efeitos colaterais incluem boca seca, falta de ar, palpitações, flatulência, bolinhas verdes nas suas mãos e visões fantasiosas do Godzilla atacando a sua cidade enquanto chove. É sério isso! É como ler a bula, mesmo. Só que num comercial de remédio. (não consegui achar nenhum vídeo de comercial no Youtube pra mostrar, infelizmente. Se alguém encontrar, comenta aí!)
Minha aposta é que fazem isso para não tomarem processo - algo que se faz, E MUITO, por lá. Melhor que ser advogado no Brasil é ser advogado nos EUA, por que se você tomou Y e teve diarreia, como isso não estava sendo citado na propaganda, pode processar o laboratório fabricante
Anúncios televisivos de escritórios de advocacia especializados em processar por um determinado problema de saúde chovem lá também. Lembro de um que vi em Miami que oferecia ajuda a quem estava com asbestose.

Depois do 11 de setembro, muito se fala sobre essa doença. Quando construíram as torres gêmeas, no fim da década de 60, aterraram uma parte do local onde elas ficavam e reforçaram a estrutura do solo para que ele aguentasse dois prédios gigantescos. Para segurar o WTC usaram muito asbesto, um material excelente em engenharia para reforçar estruturas porém carcinógeno potente. Não preciso nem falar que quando os prédios foram destruídos, coisas horrorosas foram vaporizadas e espalhadas no ar de Manhattan e região, incluindo o asbesto. 
Em consequência disso, muitos que trabalharam nos escombros ou mesmo viviam próximos à área do WTC desenvolveram doenças pulmonares, como a asbestose e até câncer de pulmão. O governo americano vem negando tratamento gratuito a algumas dessas pessoas - que na época eram considerados heróis - como o próprio filme Sicko mostra. Daí, a propaganda que vi era de um escritório especializado em conseguir, por meio de um processo, que o governo pagasse o tratamento de quem foi afetado pelo asbesto.
Fumaça altamente tóxica sendo espalhada por NY
Nesse caso, acho bem válido. O negócio é que lá se processa por muito, muito menos, como já havia dito. Se seu professor aqui já te faz terror na faculdade falando que você VAI se enrolar com advogados no futuro e PRECISA saber o código de ética médica de trás pra frente, eu nem imagino o que falam para os estudantes de medicina americanos. É a Sue Me, Sue You Blues do lendário George Harrison.
Esse aqui, que consegui tirar foto, processava GOs no caso do DIU da paciente sair do lugar
O último aspecto que queria abordar aqui em relação à percepção dos americanos sobre a saúde é o sensacionalismo. Voltando um pouco na coisa de propaganda de remédios, um dia lá assisti um anúncio (naquele mesmo formato que expliquei) de uma senhora que teve cobreiro (eu disse que ia voltar nisso!). Eu não sei se essas pessoas nas propagandas fazem relatos reais ou se são atores contratados. Mas nesse caso, a senhora afirmava que o cobreiro é uma doença grave e que todo mundo que teve catapora, inevitavelmente, terá cobreiro. Aí prosseguia para ofertar o remédio e te pedir pra perguntar pro seu médico sobre os riscos dessa enfermidade.
Coitados dos doutores de lá, devem ter que esclarecer muuuuuita coisa pros pacientes - tipo quando o Fantástico ou qualquer um desses programas anunciam que encontraram a cura do Parkinson e os neurologistas ficam possessos. Sabemos que cobreiro não é uma doença legal (que doença é legal, né?), mas ela é rara e quase ninguém que teve catapora vai desenvolvê-la. Não há necessidade de ofertar um remédio pra isso, muito menos botar caraminholas na cabeça (Chapéu seletor feelings) dos leigos. Quer dizer, a necessidade é puramente $$.
Uma vez, antes de entrar na faculdade, assisti uma entrevista do Patch Adams no programa Roda Viva da TV Cultura (quem quiser ver, deve ter por aí perdido no Youtube). Ele falava bastante de como a indústria farmacêutica é perversa - o que me deixou curiosa, já que na época eu considerava bastante fazer farmácia e não enxergava tanta maldade nos remédios aqui no Brasil. Agora, após passar um tempo na terra do Patch, consigo enxergar por que ele - uma pessoa que defende bastante ideais socialistas e tem pensamentos muito legais - detesta tanto esse mercado que, nos EUA, lucra bilhões às custas de deixar todo mundo desesperado e extremamente hipocondríaco.

Só pra finalizar: lá tem uma rede de farmácias chamada Walgreens (pra quem mora em BH e região, é tipo uma drogaria Araujo). Tem uma em cada esquina e vende de tudo: milhões de remédios, produtos médicos (como glicosímetros), maquiagem, esmaltes, roupa, souvenirs, shampoo e coisas nada a ver (minha mãe comprou uma batedeira lá). Tinha uma Walgreens gigante bem centro da Times Square, e pra mim isso simboliza o quanto eles lucram com essa paranoia que colocam na cabeça da população.

Bom pessoal, por hoje é isso. Comentem o que acharam da postagem de hoje e, mais uma vez, me desculpem por demorar tanto pra escrever! Obrigada pela leitura :)
Um abraço a todos


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